(Conto)
Após o almoço no refeitório da empresa, um homem entra no banheiro e escolhe um reservado. Faz suas necessidades mais fecundas, com um tanto de esforço, e sai. Ele é um tanto gordinho, de meia-idade.
Vai à pia. A água escorre pela torneira. Lava as mãos, enchendo-as de sabonete, e as enxágua. Esfrega água no rosto e nos poucos cabelos, com força. Apanha uma maçaroca de papel e procura se secar. Fecha a torneira. Sai do banheiro. Tem um pressentimento ruim.
Está indo de volta à sua sala quando sente um tapinha nas costas. É um homem jovem, mais baixo e magro. Está todo de verde e vermelho, usa um quepe. Lembra um jóquei de cavalos. Tem um sorriso de gerente, impessoal, e diz:
- Bom dia senhor. Sou da Patrulha Eco-Futuro.
- Ah, sim. – Estou frito. – pensou. Não hoje. O jovem continuou:
- Pude ver que o senhor almoçou no refeitório. A sua refeição foi arroz, feijão, três pedaços de bife bovino, ovos, fritas, tudo pesando 575 g, e tomou uma garrafa de Coca-Cola de 600 ml, correto?
- Sim?
- Bom, o senhor sabe que as plantações de arroz, feijão e batata ocupam o espaço que deveria ser dos animais silvestres. Logo, vou ter que aplicar uma multa pelo consumo de produtos agrícolas.
- Correto. – Disse sem convicção.
- E o senhor ingeriu 210 g de carne bovina. O senhor está ciente que os animais consomem toneladas de vegetais para fornecer os bifes, além do consumo de água. São muitos litros de água para cada quilo de carne produzida. Você vai ter que pagar uma multa por isso também.
- Bom, os animais bebem água. Eles urinam e suam, a água não fica retida neles. – Tentou argumentar.
- O senhor tem um ponto aí. Mas e as toneladas de vegetais, que ocupam espaço que deveria ser das árvores que reduzem o efeito estufa? E dos animais silvestres. Fora a flatulência dos bichos, que liberam metano e ajudam a aquecer a atmosfera. A multa é inevitável. Um adicional pelos ovos, também.
O homem suava em bicas. O patrulheiro continuou:
- E a Coca-Cola? São quatro litros de água para produzir um litro de Coca. O senhor tem que pagar a taxa pelos 2,4l desperdiçados (foi uma garrafa de 600 ml).
Uma pausa. Prosseguiu:
- O senhor em seguida foi ao troninho e evacuou. A vossa própria flatulência causa também o aquecimento global. Há de se comprar um selo verde antes de usar o banheiro, o que cobre também os custos do esgoto e da despoluição. E o senhor deixou a torneira aberta por cinco minutos e nove segundos. Há uma punição por cada segundo adicional aos três primeiros. Foram 306 segundos! Muito grave. O senhor usou também papel ao se exnxugar. Multa para você e para a empresa.
O patrulheiro pega um talão eletrônico. Calcula a multa e o preço dos selos verdes e os mostra no visor para o aturdido infrator. Acrescenta:
- Pagamento imediato, viu
Ele sua. Pega a carteira no bolso de trás, resignado. Passa o cartão ao patrulheiro, que desconta créditos suficientes pelas infrações.
O homem está indo embora, arrastando os passos, quando ouve:
- Ah, notei ainda que o senhor tem 89 kg de massa, para uma altura de 1,76m. Isso é sobrepeso, não pode. Faz com que os transportes públicos tenham que gastar mais combustível para transportá-lo.
- Isso dá multa?
- Ah não. Só estou lembrando o senhor. A passagem dos coletivos já leva em conta essa diferença. Tenha um bom dia.
O homem fica no corredor, aturdido, olhando para o patrulheiro que se afasta a passos ligeiros. Fica em dúvida sobre o que iria almoçar amanhã.