Lei Seca

Um espaço para discutir as grandes questões. Editor-chefe: Luiz Augusto

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Advogado, vive em São Paulo

sábado, outubro 17, 2009

As princesas falidas

Já tinha visto castelos e palácios, mas nunca tinha visto a realeza em pessoa. Rei ou rainha, em minha vida, só nos naipes do carteado.
Eis que, no lugar mais inesperado, uma praça de alimentação de shopping, aparecem duas princesas.
Mas não falo aqui de moças bonitas, estonteantes, que façam os homens virar a cabeça e suspirar “que princesas”.
Não, eram princesas mesmo.
Mas algo faltava. Elas pegaram elas próprias sua mesa, perto da minha. Não tinham séquito, seguranças, pajens ou damas de honra. Vestiam vestidos de tecidos baratos, uma de azul, a outra de amarelo. A maquiagem era exagerada. Tiaras de bijuteria adornavam seus cabelos. As duas jovens e louras. Não eram bonitas. Uma tinha aparelho nos dentes.
Era como se Cinderela estivesse nos primeiros minutos da meia-noite, na reversão do feitiço da fada-madrinha, com a abóbora encolhendo, o condutor do coche voltando a ser um rato e suas roupas se tranformando em andrajos.
Provavelmente trabalhavam para alguma loja do shopping, em alguma promoção, ou eram animadoras infantis.
Quem passava não deixava de olhar com curiosidade. As crianças sorriam e paravam para provocá-las.
A de amarelo levantou e foi buscar os lanches. A outra, a de azul, esperava, cotovelos na mesa, ar de enfado, o vestido amassado e arrastando no chão, a tiara folgada mal equilibrando-se na cabeça.
Quantas coisas não imaginei. E se fossem princesas mesmo? Talvez fossem descendentes da própria Anastácia Romanov, escapadas dos bolcheviques e aqui refugiadas. Ou herdeiras dos Orleans e Bragança, e que apenas ficaram com fome , como qualquer um.
Tinham sangue azul, dezoito sobrenomes, mas gostavam de um bom hamburguer. Quem sabe o cardápio do castelo as entediava? Faisão assado todo dia cansa. Elas fugiram para ver o mundo, como o príncipe Sidarta.
Acertei nos gostos culinários delas. A princesa amarela volta, com uma bandeja do McDonald´s. Um ar fake, de princesa da Disney, dos filmes da Sissi. Será que as princesas reais usariam aquelas roupas? Para dormir deve ser um problema. Uma herdeira dos Habsburgo não comeria Big Mac.
Elas comem, quietas, já meio sem graça com o assédio das crianças que puxam seus vestidos. Uma mãe ralha o filho:
- Para menino, não encosta aí.
O menino é arrastado para longe, erguido pelas orelhas, e protestando:
- Mãe, deixa eu ver a princesa...
As princesas ignoram a cena, sugando seus canudinhos de refrigerante.
Então, para terminar de quebrar o pouco encanto da cena, surge o príncipe encantado, mais sapo que príncipe. Um sujeito de calça jeans, moletom e boné, provavelmente colega delas, senta com as princesas, e, gigolô como só, passa a filar batatas fritas das princesas.
Uma delas protesta por seus direitos:
- Ô meu manera nas fritas aí?
Ah, eu ainda tinha ilusão que pelo menos o papo delas fosse nobre. Elas conversam com o sujeito. Falam de baladas, bebedeiras, internet e chefes chatos. Muita gíria, alguns palavrões, vindos da princesa azul, a mais desbocada.
Princesas fajutas. Parecia um daqueles filmes em que um malandro se disfarça de padre (ou uma vigarista de freira) para escapar da polícia. A minha imaginação fervia. Elas eram estelionatárias procuradas que se travestem de princesas para um último golpe.
Ou seriam elas Graces Kellys sem Rainiers e sem Mônaco? Habsburgas em perdição. Romanovs sem trono. Descendentes de um reino que não mais existia. Vivendo das memórias de quando as coisas eram boas e a vida leve.
As princesas falidas.

domingo, outubro 11, 2009

Bastardo Inglório

Ontem fui no cinema assistir Bastardos Inglórios, do Tarantino.
Falava de um ficcional esquadrão anti-nazista que planeja matar Hitler durante a Segunda Guerra.
Por uma ou duas vezes o nome de Leni Riefenstahl, a cineasta do ditador austríaco, é mencionado.
Por coincidência, antes do filme passa um trailer de "Lula, o filho do Brasil", longa-metragem que vai estrear ano que vêm
Sempre achei brega aquele pessoal de antigamente que aplaudia os filmes no cinema, como se o diretor estivesse lá para receber as glórias.
Mas não é que ontem não me contive e vaiei o trailer do filme do Lula? Devem ter achado que eu estava louco.
O filme é um culto à personalidade descarado.
Saio do cinema e a Istoé da semana justamente chamava o filme de "Cinema Eleitoral (Nada) Gratuito.
Gratuito nada. Será que não rolou uma lei Rouanet para bancá-lo? Dinheiro nosso para falar bem do Lula?
Prefiro não saber.
Nunca antes na história desse país um governante em pleno mandato é objeto de um filme para glorificá-lo.
Acho que só o Getúlio ousou um negócio desse, tão personalista.
Hitler e Mussolini ousaram.
Getúlio se matou. Hitler terminou se suicidando cercado num bunker. Mussolini acabou seus dias pendurado num gancho de açougueiro.
"Lula, o filho do Brasil", então, seria o nosso "O Triunfo da Vontade". O produtor de cinema Barretão seria nossa Leni Riefenstahl. Quem é o Goebbels de Lula?
Acho que um nome melhor para o filme do Lula seria "Bastardo Inglório".