Lei Seca

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sexta-feira, novembro 16, 2007

D´Gajão mata para vingar no Planeta Terror

O filme muito ruim, chamado de B, sempre me atraiu. Assisto-o sem grandes pretensões, como se fossem comédias. Os mais divertidos são aqueles em que o diretor queria fazer um filme sério e, como um marido traído, só vai perceber que sua obra é recebida pela platéia com gargalhadas quando já é tarde demais e o projetor roda no escurinho.
Certa vez esperava um grupo de amigos para uma sessão de cinema caseira. Queria algo leve e nonsense para assistir. Não tive dúvidas. Aluguei a fita “A Geladeira Diabólica”, em que esse geralmente pacífico eletrodoméstico cria pernas e passa a ter instintos homicidas, esmagando à golpes de portadas os incautos habitantes de um apartamento.
Foi então com alegria que recebi a notícia que chegava às salas de cinema brasileiras o primeiro filme do díptico “Grindhouse”, projeto em que os diretores Robert Rodriguez e Quentin Tarantino se propuseram cada um a dirigir, separados, uma película B.
“Planeta Terror” é a fita de Rodriguez. O programa é completo e começa até mesmo com um falso trailer, de um hipotético filme chamado “Machete”, em que um assassino mexicano descarrega a fúria de seus facões nos caras maus e ainda fatura mulheres bonitas.
Rodriguez ainda colocou um desleixo proposital nas filmagens, fazendo parecer que a fita está riscada e arranhada. Lá pelas tantas, numa cena de sexo prestes a esquentar, um dos rolos some, com um pedido de desculpas da “gerência”.
A trama não poderia ser pior. Zumbis comedores de gente invadem uma cidade no Texas e são enfrentados por uma stripper perneta e que utiliza como muleta uma potente metralhadora. Não é péssimo? Ou melhor, não é ótimo? Estou rindo até agora.
No embalo de ver películas ruins fiquei sabendo que havia uma mostra de filmes do cineasta brasileiro José Mojica Marins em cartaz. O nome não é familiar para o grande público. Trata-se de ninguém menos que Zé do Caixão, criador e intérprete do mítico personagem. Mojica Marins se mistura com seu personagem, é como se ele fosse o Dr. Jekill e o Zé do Caixão, seu Mr. Hyde.
Vou ao cineclube. O diretor não fez apenas filmes de terror e se aventurou também pelo faroeste, drama, comédia, pornô... Leio as sinopses. “´À Meia-Noite Levarei Sua Alma´ - O agente funerário Zé do Caixão humilha e ridiculariza os ingênuos moradores de uma pequena cidade. E Zé tem uma grande obsessão: gerar o filho perfeito”. “´Inferno Carnal´ – Raquel resolve matar o marido jogando um ácido em seu rosto, para ficar com sua fortuna. Mas o marido sobrevive”.
Está passando “D´Gajão Mata Para Vingar”. Filmagem tosca. Atores canastrões. Defeitos especiais. Um bando de ciganos do Paraná sobrevive de prever o futuro e de vender artesanato na cidade mais próxima. Eles tem um conflito fundiário com o Coronel. Seu líder, D´Gajão, é o herói da história. Um capataz do Coronel mata a filha deste por acidente, ao tentar violá-la, e joga a culpa dos ciganos. Este fica furioso ao saber da morte da filha e manda seus capangas acabarem com a ciganada.
D´Gajão passa a madrugada na cidade jogando cartas e escapa do massacre. Volta ao acampamento, e, num momento “Rastros de Ódio”, encontra todos mortos. Falo de uma cena imitadíssima desse filme americano, em que o herói retorna para casa e vê tudo destruído pelos inimigos e em chamas. É clichê usado até no primeiro Guerra nas Estrelas.
O filme é tão cheio de clichês, mas e daí? Há um clássico. O menino sobrevivente do massacre dura o tempo suficiente moribundo para acusar os responsáveis, e morre nos braços do herói. Ainda lembro do garoto em seus suspiros finais: “D´Gajão, D´Gajão, os homens da fazenda...”
Sua mulher está nas garras do Coronel, e D´Gajão jura vingança. Ele se torna um justiceiro (antes da série “Desejo de Matar”), capaz de arremessar facas e sobreviver a violentos tiroteios.
O resto do filme mostra D´Gajão se livrando dos jagunços do Coronel. O cigano usa vários truques para se livrar de seus inimigos, como fugir da cadeia fingindo doença. E há cenas hilárias, como a que um bêbado que, no meio de um tiroteio, fica olhando para as pernas de duas moças escondidas. Ele caminha até elas. Suspense. Ele estica a mão para as pernas...e agarra uma garrafa de pinga ao lado...
O confronto final, numa brilhante idéia do diretor, se dá um meio às formações geológicas de Vila Velha, em Ponta Grossa, paragem que abriga aquelas belas rochas gigantes. Como num canyon de filmes gringos, os duelos do clímax se dão lá, com direito a tiroteios com eco, marchas de cavalo no pôr-do-sol, e outros clichês de faroeste. Assim que o Coronel é derrota, ele enlouquece, numa cena indescritível.
Tem muito diretor que tenta entreter as platéias e não consegue. Mojica Marins ainda não foi devidamente reconhecido. Creio que essa mostra lhe fez justiça. Ainda quero ver um filme do Zé do Caixão, e muitos outros filmes B. E viva D´Gajão, o cigano vingador

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Vi este filme quando adolescente no cinema em Cambará no estado do Paraná. Achei bom e gostaria muito de conseguir este filme.

1/11/10 19:51  

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