Lua perdida
Há um conhecido filme, Apollo 13, com Tom Hanks, que conta a história da fracassada missão à Lua de mesmo nome, ocorrida em 1970, e que quase acabou com a morte dos tripulantes da nave. Ele é baseado num sério livro co-escrito por Jim Lovell, um dos astronautas, chamado Lost Moon (Lua perdida).
Eles nunca chegaram à Lua. Esse é um dos aspectos da viagem que o título do livro parece querer enfocar, e que no filme só aparece num breve lamento silencioso de Tom Hanks ao olhar para o nosso satélite. Passado o susto que quase lhe custou a vida, o astronauta lamenta não ter pisado no solo lunar. Ele nunca irá dar saltos na gravidade baixa, ou olhar a Terra do chão de outro lugar. Jamais terá outra chance sobre a Lua, como as estirpes condenadas a cem anos de solidão jamais teriam outra oportunidade sobre a Terra.
Eu, provavelmente, não pisarei na Lua. A popularização das viagens além da atmosfera não será no meu tempo. Mas há um lugar mais perto, que para mim é o equivalente à Lua para Jim Lovell. É o nosso estado da Bahia.
Certa vez embarquei num navio, o Island Escape, junto com meu amigo Caio, para um cruzeiro de uma semana. Estávamos empolgados com as paradas que ocorreriam no Rio e em Salvador. A viagem prometia.
O navio não tinha uma estrutura tão boa. Não havia muito o que fazer lá durante o dia, exceto ficar na piscina. Enquanto o navio estava em alto-mar o cassino funcionava, e eu desenvolvi um método de jogo para os caça-níqueis que me permitiria ganhar oito dólares por dia (não adiantam me ameaçar, não conto o segredo). Até o fim da viagem eu teria 56 dólares a mais.
No dia seguinte após a partida nós descemos no Rio, onde um taxista careiro e boquirroto nos levou ao Corcovado, para vermos o indefectível Cristo. Voltamos ao Island e o navio rumou norte, em direção à Bahia. Eu finalmente conheceria Salvador, o Pelourinho e o Elevador Lacerda. Tomaria um chope no Farol da Barra.
Mas enquanto isso, nas engrenagens do navio, uma peça defeituosa pifava de vez. Imaginem como num filme, um close em câmera lenta para a peça em questão, e a fumacinha saindo...
Estava no cassino, pronto para quebrar novamente a banca e obter meus oito dólares daquela noite, quando o sistema de som do navio começa a transmitir uma mensagem especial do comandante. Eu não conseguia escutar direito. As pessoas começaram a se alvoroçar. Pelo tumulto parecia que ele estava anunciando que um iceberg havia se chocado contra o casco, e que os botes salva-vidas já estavam a postos.
Quando os ânimos se acalmaram pude entender. O ar-condicionado do navio havia quebrado, o que impossibilitaria que a viagem prosseguisse até a Bahia, que tinha águas muito quentes. O navio voltaria à Santos no dia seguinte, um domingo, e depois seguiria para um outro roteiro, tendo por destino Florianópolis, região de águas geladas. Eram dadas três opções. Descer em Santos no dia seguinte e pegar o dinheiro de volta, ou seguir para o roteiro no Sul, ou embarcar para a mesma viagem uma semana depois. Deliberei com meu companheiro de viagem. Caio não podia embarcar em uma semana, e eu tinha acabado de passar alguns dias na capital catarinense. O melhor custo-benefício era Santos e o reembolso. Afinal,era um mini-cruzeiro de graça.
Como dito, no dia seguinte o navio estava atracado em Santos. Em boa sacada, percebi que não era preciso descer imediatamente. Passamos o dia no navio, tomando drinques na piscina e comendo, antes que o Island partisse de novo. Era como um dia no clube.
Mas desci do transatlântico com a sensação de que faltava algo. Era a Bahia, então perdida. Por muito tempo olhei para as fotos de lá como os astronautas da Apollo 13 olham para a Lua.
Então, a reviravolta. Parte da minha família marcou, no começo do ano, para a semana do Natal, um cruzeiro à Bahia. Estava morrendo de inveja deles.
Até que recebo a notícia de uma desistência. Minha avó não iria mais, e para não perder a passagem eu sou convidado a assumir o lugar dela. Enfim, conhecerei a minha Lua perdida.
Sinto-me como outro personagem de filme, o Red (Morgan Freeman) de Um Sonho de Liberdade. Após quarenta anos na cadeia, ele é posto em liberdade condicional. Resolve ir encontrar seu amigo Andy Dufresne, que havia escapado da prisão em que estavam e o aguardava no México, tocando um hotel à beira do mar, num local sem memória.
Red, no ônibus rumo à cidadezinha de Zihuatanejo, pensa: “Espero que o Pacífico seja tão azul quanto nos meus sonhos. Espero.” Eu, espero que o Atlântico da Bahia seja tão azul quanto nos meus sonhos. Espero.
Eles nunca chegaram à Lua. Esse é um dos aspectos da viagem que o título do livro parece querer enfocar, e que no filme só aparece num breve lamento silencioso de Tom Hanks ao olhar para o nosso satélite. Passado o susto que quase lhe custou a vida, o astronauta lamenta não ter pisado no solo lunar. Ele nunca irá dar saltos na gravidade baixa, ou olhar a Terra do chão de outro lugar. Jamais terá outra chance sobre a Lua, como as estirpes condenadas a cem anos de solidão jamais teriam outra oportunidade sobre a Terra.
Eu, provavelmente, não pisarei na Lua. A popularização das viagens além da atmosfera não será no meu tempo. Mas há um lugar mais perto, que para mim é o equivalente à Lua para Jim Lovell. É o nosso estado da Bahia.
Certa vez embarquei num navio, o Island Escape, junto com meu amigo Caio, para um cruzeiro de uma semana. Estávamos empolgados com as paradas que ocorreriam no Rio e em Salvador. A viagem prometia.
O navio não tinha uma estrutura tão boa. Não havia muito o que fazer lá durante o dia, exceto ficar na piscina. Enquanto o navio estava em alto-mar o cassino funcionava, e eu desenvolvi um método de jogo para os caça-níqueis que me permitiria ganhar oito dólares por dia (não adiantam me ameaçar, não conto o segredo). Até o fim da viagem eu teria 56 dólares a mais.
No dia seguinte após a partida nós descemos no Rio, onde um taxista careiro e boquirroto nos levou ao Corcovado, para vermos o indefectível Cristo. Voltamos ao Island e o navio rumou norte, em direção à Bahia. Eu finalmente conheceria Salvador, o Pelourinho e o Elevador Lacerda. Tomaria um chope no Farol da Barra.
Mas enquanto isso, nas engrenagens do navio, uma peça defeituosa pifava de vez. Imaginem como num filme, um close em câmera lenta para a peça em questão, e a fumacinha saindo...
Estava no cassino, pronto para quebrar novamente a banca e obter meus oito dólares daquela noite, quando o sistema de som do navio começa a transmitir uma mensagem especial do comandante. Eu não conseguia escutar direito. As pessoas começaram a se alvoroçar. Pelo tumulto parecia que ele estava anunciando que um iceberg havia se chocado contra o casco, e que os botes salva-vidas já estavam a postos.
Quando os ânimos se acalmaram pude entender. O ar-condicionado do navio havia quebrado, o que impossibilitaria que a viagem prosseguisse até a Bahia, que tinha águas muito quentes. O navio voltaria à Santos no dia seguinte, um domingo, e depois seguiria para um outro roteiro, tendo por destino Florianópolis, região de águas geladas. Eram dadas três opções. Descer em Santos no dia seguinte e pegar o dinheiro de volta, ou seguir para o roteiro no Sul, ou embarcar para a mesma viagem uma semana depois. Deliberei com meu companheiro de viagem. Caio não podia embarcar em uma semana, e eu tinha acabado de passar alguns dias na capital catarinense. O melhor custo-benefício era Santos e o reembolso. Afinal,era um mini-cruzeiro de graça.
Como dito, no dia seguinte o navio estava atracado em Santos. Em boa sacada, percebi que não era preciso descer imediatamente. Passamos o dia no navio, tomando drinques na piscina e comendo, antes que o Island partisse de novo. Era como um dia no clube.
Mas desci do transatlântico com a sensação de que faltava algo. Era a Bahia, então perdida. Por muito tempo olhei para as fotos de lá como os astronautas da Apollo 13 olham para a Lua.
Então, a reviravolta. Parte da minha família marcou, no começo do ano, para a semana do Natal, um cruzeiro à Bahia. Estava morrendo de inveja deles.
Até que recebo a notícia de uma desistência. Minha avó não iria mais, e para não perder a passagem eu sou convidado a assumir o lugar dela. Enfim, conhecerei a minha Lua perdida.
Sinto-me como outro personagem de filme, o Red (Morgan Freeman) de Um Sonho de Liberdade. Após quarenta anos na cadeia, ele é posto em liberdade condicional. Resolve ir encontrar seu amigo Andy Dufresne, que havia escapado da prisão em que estavam e o aguardava no México, tocando um hotel à beira do mar, num local sem memória.
Red, no ônibus rumo à cidadezinha de Zihuatanejo, pensa: “Espero que o Pacífico seja tão azul quanto nos meus sonhos. Espero.” Eu, espero que o Atlântico da Bahia seja tão azul quanto nos meus sonhos. Espero.
5 Comments:
Guto
Garanto que dessa vez,chegaré a ``LUA AZUL´´ pois viajará num belo navio e não no Island, vulgo Apollo 13 ! rs
Boa Viagem
Beto
Dae Gutão ... quero saber desse seu método para os caça-níqueis!!! Vou viver disso!!!! ahahahahahah ABCS
Rafa Campos
Pois é Rafa, consta que o próprio dono da Island Cruises mandou o navio voltar ao ver o prejuízo que ele ia tomar (rs)
Abraço,
Pois é Betão, agora vai!
aahhahahahhaahahha quer dizer que essa história do ar condicionado foui apenas uma desculpa? Tudo em virtude do tarado dos caça-níqueis...... Abcssss
Rafa
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